quinta-feira, 22 de setembro de 2011

As mudanças na paisagem




No centro da cidade avança a “modernidade” e dispersa a memória


O domingo passado foi bem agitado lá pelos lados do “centro velho” da cidade. Acho interessante esta expressão porque ela formaliza a consciência de que o passado ficou velho, esquecido no tempo e nas lembranças.
É assim que as emissoras de televisão se referem à região da ‘cracolândia’, em São Paulo, ou mesmo quando falam da ilustre Estação da Luz. No caso da estação a criatividade e o financiamento público conseguiram superar a dificuldade com a instalação do Museu da Língua Portuguesa.
Missão difícil esta de manter viva a memória de um povo através da preservação dos prédios históricos e monumentos. Muitas vezes, a vontade de alguns esbarra no desinteresse da maioria e acaba ficando só na vontade.
Quando o assunto é com as cidades históricas, a busca por verbas de patrocínio cultural se torna mais acessível e as chances de preservação de uma parte da história aumentam, jogando a favor da cultura e da memória.
Aliás, eu pergunto: e qual cidade não é histórica?
Prédio velho é um enigma. Se deixamos como está, não aluga porque tem problema de vazamentos de toda ordem, tem problemas com banheiros, com escadas, com as portas e cubículos, que não atendem às novas normas de segurança e prevenção de incêndio, com assoalhos de madeira, com a fiação elétrica e com o quadro de distribuição da rede de energia, entre outros. A estrutura vai se deteriorando mais a cada dia e se torna um perigo iminente, em pleno centro comercial, porque as infiltrações das águas de chuva, nas velhas calhas esburacadas pela ferrugem, fazem um trabalho silencioso.
Mesmo um bom projeto de revitalização do espaço vai exigir grandes investimentos para adequar-se às novas exigências legais de segurança e ocupação. A conta não fecha porque na hora de se celebrar um novo contrato de locação o inquilino vai se basear nos valores de aluguéis que vigoram na região, deixando de lado a questão histórica cultural. Seria preciso uma linha de crédito especial, via governo federal ou estadual, para incentivar a vontade pública da preservação, com a necessária modernização.
Enquanto este impasse não tiver uma boa proposta, a tendência é a substituição gradativa dos velhos prédios por novos empreendimentos comerciais.
É assim que Marília despertou na segunda-feira, 12/09, com mais duas páginas viradas na sua história. O prédio residencial, localizado na esquina das ruas 4 de Abril com a Prudente de Moraes, onde já funcionou também o Hotel Federal, fecha suas portas definitivamente. Acabou também a Peixaria Sakai, na rua 15 de Novembro, bem ao lado do Mercadão Municipal, e mais seis pequenas casas que ficavam nos fundos foram demolidas.
O interessante é que as paredes do sobradão da 4 de Abril, altas e largas, não têm vigas ou amarração, é tijolo sobre tijolo e argamassa. Chamam a atenção os recortes e rococós que fazem o acabamento dos beirais e sacadas, obras de arte que integram o design visual do conjunto e que na época já davam o toque do tridimensional; basta olhar para os barrigudinhos que adornam a parte inferior das janelas e se percebe esta proposta claramente.
Hoje, são áreas comercialmente nobres, porém, os prédios nobres do passado já não encontram mais seu espaço.

Ivan Evangelista Jr,
Da Comissão de Registros de Marília
Publicado no Jornal Diário de Marília, coluna Raízes, em 18/09/11



Um comentário:

  1. Ivan, uma cidade que não respeita sua memória, não respeita a história...
    Marília é uma cidade tão boa, tão "vanguarda", ´quase inacreditável a falta de preservação :(

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