terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Lojas de presentes

Vista geral da turma 2016
Hoje nós tivemos a entrega dos certificados de dois importantes cursos realizados pelo Univem para a comunidade. O curso tem o nome de Inclusão Digital e atende dois públicos distintos - os alunos da Apae Marília, neste caso já se preparando para ingressar no mercado do trabalho, e os alunos da Melhor Idade, outra turma animada que faz questão de acompanhar as novas tecnologias.
Desde os primeiros passos para utilizar um computador até algumas funções mais avançadas são conteúdos ministrados por alunos monitores como atividades de extensão dos Cursos de Ciência da Computação e Sistemas de Informação. A moçada da Apae aprendeu a fazer a página pessoal no Face e agora estão curtindo muito trocar informações com amigos e com os professores.
O pessoal da Melhor Idade, além dos primeiros passos na operação dos computadores tiveram aulas de tecnologias sociais disponíveis nos telefones celulares.
Kaoro e Hidee
E foi no momento da entrega dos certificados que eu observei dois rostos muito conhecidos dos marilienses,  personagens do vibrante comércio da nossa querida Marília. Para nossa alegria as senhoras Kaor Kamakura e Hidee Yamamoto fizeram parte desta nova turma e estavam vibrando com o recebimento de dois certificados.
Dona Kaor mes fez uma revelação: "na verdade o nome correto é Kaoro, que pode ser traduzido para aroma/perfume em português, mas o meu pai não sabia pronunciar  e na hora do registro ficou Kaor mesmo." Outra revelação gostosa de ouvir: "eu  trabalhei alguns anos com na Casa Yamamoto, antes de abrir a minha loja, a Utilar presentes."
E depois de longos anos elas voltam a se encontrar fazendo um curso de tecnologia da informação. A Hidee estava irradiante, aliás, não só ela, como toda a turma da Melhor Idade pelas novas conquistas.
Nos comentários da apresentação fiz questão de registrar lembranças do passado onde a Utilar era o endereço certo para quem desejava comprar um presente de casamento ou os tradicionais faqueiros que tanto agradavam aos noivos. Da Casa Ono, a lembrança do enorme balcão de madeira e das prateleiras que chegavam até o teto com utilidades do lar e presentes diversos. A Casa Ono, se hoje estivesse com as portas abertas, seria comparada as lojas de conveniência que oferecem quase dos os itens da linha doméstica e de presentes.

Desta modalidade resta a Casa Formosa, na rua 9 de julho, onde sempre esteve ao lado do Supermercado Pastorinho. Vou lá vez em quando para me inspirar na construção  de novos textos. No caixa, a dona do negócio,sempre, "um olho no gato e outro no peixe", ou seja, faz os recebimentos mas não descuida do balcão de atendimentos.

sábado, 3 de outubro de 2015

Fotógrafo garimpa ruas de Marília em busca de fotos e boas histórias

A Vida (o Cristo) nos guarda sempre boas surpresas.
Depois de um longo tempo hoje eu consegui levar o meu amigo Wenceslau (Lau) para curtirmos um passeio juntos. Ele está se recuperando bem do avc que nos deu um susto e já consegue andar com o auxílio de uma bengala. O cara é forte, é decidido e teve o mais importante - o amparo e todo carinho da família.
Voltamos ao apiário que ele me ajudou a formar e quando lá chegamos quase nem deu tempo de parar o carro, já foi abrindo a porta e queria ver como tudo estava. Momentos mágicos, tudo verdinho, galinhada solta no terreiro, a mata ao fundo, viva e literalmente respirando vida.
Retornamos felizes para Marília e eu o deixei em sua casa. Passei em alguns lugares , fiz umas compras e tive um bom almoço ao lado dos meus filhos, da esposa e do neto Matheus (Guleo).
A soneca pós almoço é sagrada e como diz um amigo: "faz bem para a pele e para o coração". Tempinho mais fresco, a madorna, que geralmente é no estilo tiro curto, foi um pouquinho mais longa
Assim que acordei, um café...e ligo o computador para passar uma lida nos e-mails do dia. O amigo Ramon Barbosa Francon mandou e-mail com os dizeres: parabéns pela reportagem.
De qual reportagem estaria falando? Fui conferir e vi que hoje, justamente hoje, o dia em que tive novamente a companhia do amigo Lau no apiário, a TV TEM nos presenteou com matéria gravada há algum tempo.
Em uma das boas conversas com meu Tio Dorini, pessoa inteligente e sensível, nós falávamos sobre um tema que explica tudo isso: o Universo conspira a nosso favor, basta deixar que as coisas aconteçam, contribuindo para o conjunto e curtindo as boas amizades. A Vida conspirou novamente, juntando uma série de fatos isolados, em tempos diferentes, mas que tem tudo em comum - a Vida, os amigos, as imagens e as histórias desta terra que tanto amo.
Eu os convido a assistir ao documentário da TV Tem e expresso meus sinceros agradecimentos pelo carinho da equipe em tornar a matéria um documento informativo e poético. Que boa surpresa vocês nos deram hoje. OBRIGADO, de coração!


http://gshow.globo.com/TV-Tem/Revista-de-Sabado/noticia/2015/10/fotografo-garimpa-ruas-de-marilia-em-busca-de-fotos-e-boas-historias.html

Foto reprodução - TV TEM

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

A feira, sempre a feira

Panelas de ferro e produtos da roça
Desde que os feirantes começaram a utilizar as lonas azuis na cobertura das barracas os itens expostos ganharam uma tonalidade diferente. Para os olhos menos atentos parece que tudo fica com a cor mais escura e pode até inibir a compra.
Mas a qualidade dos procutos continua insuperável e, tendo a paciência de procurar, certamente vai encontrar frutas muito doces e pés de alface merecedores de compartilhar boutiques de flores.
Um dos feirantes está buscando mercadorias no estado de Minas e trouxe mamões que há muito eu não via por aqui. Frutos grandes, alguns passando de 4 Kg, viçosos e doces. O preço? Uma pexinxa, dois mamões por R$ 5,00.
A banca de peixe está passando por melhorias e a Da. Maria limpa as sardinha com maestria. Tira as escamas, tira os espinhos da dorsal e arruma as espalmadas nas bandejinhas, prontas para chegar em casa, temperar no sal e limão, passar no fubá e fritar A casquinha fica crocante e o recheio bem macio.
A banca do Café do Feirante ganhou maior variedade e agora tem amendoim in natura, feijão, requeijão do norte, queijo fresco, biscoito de polvilho, doces de Minas, pão caseiro e frutas cristalizadas.
A moda da mandioca descascada pegou. O que se vende de mandioca limpa é algo que deveria ser mensurado pra gente ter a noção do quanto este prato é apreciado pelos compradores. O preço ajuda, vai de R$ 2 a R$ 3 o pacotinho, as variedades preferidas são a vassourinha e a mandioca amarela.
Seis garapeiros moem canas ininterruptamente e servem fartos copos, geladinhos, vai com, ou sem limão (?), e a turma se reúne em volta da moenda barulhenta enquanto os goles matam a sede e deixam o famoso bigodinho de espuma.
Outra barraca bem Brasil é a do milho verde. A família se especializou em produzir delícias do milho, tudo preparado ali, na frente do público que forma fila enquanto espera a próxima panelada de pamonha. O milho cozido é cortado caprichosamente em bandejas e servido para comer com colher, a pamonha é comida na palha mesmo, saindo fumaça ainda e queimando o beiço dos mais afoitos. E ainda tem curau, bolo de milho e espigas verdes para levar pra casa e fazer refogado na manteiga com um toque de cheiro-verde no final.
Quase tudo estava por R$ 2,00. As folhas, as beterrabas, as batatinhas, pimentão, salsinha e cebolinha e as mudas de várias espécies para quem curte uma horta caseira.
Desta vez eu trouxe para casa um pé de arruda, um de erva-doce e outro de losna. A losna fez parte da minha infância, tinha um pé enorme no quinta, bem pertinho do pé de laranja lima. Dois excelentes digestivos e reguladores da digestão.
Viva a vida e boa semana a todos.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Nossa bandeira e o nosso Brasão


Na visita ao museu municipal que fiz na semana passada, além de gravar a entrevista com o Sr. Otávio Torrecilla, eu tive dele uma boa aula sobre a nossa bandeira e o nosso brasão. Tudo começou porque em uma das vitrines esta exposta uma das bandeiras de Marília, com a cor branca de fundo e o brasão ao centro, versão esta que eu não conhecia, pois a atual tem as cores vermelha e branca.
Ao comentar o assunto o Sr. Torrecilla me chamou a atenção para outro fato relevante e me disse para procurar um erro no brasão. Erro? Como assim?
Comparei os modelos confeccionados e exibidos para duas oportunidades festivas da cidade; a da comemoração dos 25 anos e depois as medalhas e folhetos para as comemorações dos 50 anos. Os brasões são diferentes porque exibem duas versões de um símbolo que representa os pés de café, cultura que foi a grande alavanca do desenvolvimento do agronegócio em Marília. Mas isto não era um erro e sim uma mudança de design e o meu interlocutor questionava o erro.
Além destas observações eu questionei a cor verde do triângulo, já que na bandeira mineira o triângulo está na cor vermelha. Nesta relação mental direta e simples a comparação me remetia a um erro, mas não, visto que a aplicação é da bandeira dos inconfidentes.
Primeira bandeira, fundo branco, triângulo na cor
 vermelha, três torres, pé de café no fundo amarelo,
frase em latim.
Vencido pela curiosidade ele me apontou a incorreção: o braço que sustenta a flamula estava desenhado de forma incorreta, sendo este, o braço esquerdo, porém, a mão que segura a flamula é a destra, ou seja, uma deformação que passou despercebida por longos 40 anos.
















Novo brasão, com o braço correto, as torres corrigidas, o triângulo na
cor verde e a frase em português
Somente no ano de 1978 a correção aconteceu promovendo-se o novo desenho do braço armado. Observar também que o pé de café também foi substituído pela catraca, símbolo do comércio pujante da cidade e as torres redesenhadas.
Na biblioteca da Comissão de Registros Históricos tem muito material sobre o assunto e vale pesquisar para conhecer mais sobre tão importante símbolo municipal. Quando o museu contar com instalações mais adequadas, faço a sugestão para montarmos uma linha cronológica dos fatos e dos modelos dos brasões já utilizados para que os visitantes entendam e possam comparar as diferentes peças que lá estão.

Marília é uma das poucas cidades que conta com a Comissão de Registros Históricos instituída e nossas contribuições e observações são sempre no sentido de preservar a memória. Há sim um hiato entre as decisões e execuções de trabalhos que com o tempo podem ser corrigidos, fato que considero normal, como por exemplo, o ato municipal que mudou o nome da rua Alagoas para rua Paulo Corrêa de Lara, no entanto a placa de sinalização continua com o nome antigo. 
Engenheiro João Batista Meiler segurando o quadro que hoje
 faz parte do acervo do museu municipal


Ivan Evangelista Jr, pesquisador e membro da Comissão de Registros Históricos de Marília

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Tem franguinho na panela

Novo local: bancas na av. das Indústrias e na Sampaio Vidal 
Parece que a mudança do local da tradicional feira-livre de domingo foi positiva. Ao menos é o que parece quando contabilizamos o número de barracas e a variedade de opções e produtos que se pode encontrar neste espaço tão popular.
Antes, a conhecida “rua do rolo”, se restringia a uma extensão de pouco mais de 50 metros, se tanto, acomodando pequenos comerciantes de quinquilharias que se sempre encontram compradores certos. Hoje eles estão muito bem acomodados na Av. das Indústrias e as bancas se expandiram, existe maior oferta de produtos e melhor acomodação para os expositores. O espaço fácil para estacionamento dos veículos de transporte é um dos fatores deste crescimento, com a possibilidade de chegar mais próximo da banca os feirantes trazem equipamentos mais pesados e maior quantidade.
Tradicional vendedor de galinhas 
E a venda de galinhas continua fazendo sucesso. A dona de casa chega perto das gaiolas, avalia as aves, e pede para ver duas ou três. Segurando pelas pernas ela apalpa o peito, verifica debaixo das asas e depois faz uma criteriosa observação da crista. Este procedimento é uma tradição que vem dos tempos, passou de mãe para filha e se tornou um controle de qualidade. A asa tem que estar bem amarelinha, a crista, bem vermelha e saudável e o peito tem que ser carnudo. Garantia de uma panelada apetitosa.


Sapecando o frango (foto internet)
Duas formas de preparo: a de destroncar o pescoço, aquela que segura pelos pés e pua o pescoço da ave até estralar e depois deixa se debatendo até a morte, e a do corte do pescoço  podendo aparar ou não o sangue. Aparar o sangue? – Sim, depois de colhido em vasilha, segue uma pitada de sal e um pouco de cheiro-verde picado e será acrescentado ao molho quando o preparo estiver quase pronto. É o frango ao molho pardo, tradição da cozinha do interior.
Aves expostas em gaiolas
Em tempos de supermercados modernos e com bandejinhas cortes variados, tudo limpinho e higiênico, quase não se vê mais uma senhora das antigas fazer todo este ritual do estica e puxa, tira a pena, sapeca no fogo, tira os miúdos, sapeca no fogo e depois tempera para ir ao fogo. Aliás, mesmo antigamente tudo isto era feito antes da família levantar-se da cama e longe dos olhos das crianças que morriam de dó da galinha que sangrava ou se debatia no fundo do quintal. Um frango caipira nos dias atuais tem forte apelo gastronômico, mas poucos encaram na hora da refeição. Aqui em casa é assim, pode estar na mesa, acompanhado de uma polenta e de molho da melhor qualidade que não vai ganhar a preferência dos consumidores.



Caipira ao molho pardo (foto internet)
Mas tem muita gente que ainda consome o caipira na sua mais tradicional forma de preparo, prova disso é as duas bancas que ainda permanecem na feira, sempre levando mais aves para agradar os clientes. Tem domingo que chega a faltar e as encomendas já ficam agendadas para a próxima semana.

Ivan Evangelista Jr, Membro da Comissão de Registros Históricos de Marília 

sexta-feira, 24 de julho de 2015

A pendenga entre Bento de Abreu e Pereirinha

Parte do desenho geográfico das ruas da nossa querida Marília foi concebido pelo engenheiro dr. Durval de Menezes, projetado no sistema “Xadrez”, com ruas de largura de 16 metros e quarteirões de 100 por 100 metros, divididos em lotes de 40 metros, fato que levou a ser conhecido como “O Plano Xadrez”. O projeto do loteamento foi encomendado por Bento de Abreu Sampaio Vidal, ao engenheiro acima mencionado, a partir da compra da Fazenda Cincinatina, com o objetivo de estruturar o mapa dos lotes e iniciar as vendas.
Vale resgatar que antes deste episódio já estava instalado o loteamento do “Alto Cafezal”, sendo este de iniciativa dos pioneiros Pereira e Pereirinha. Consta dos registros históricos que havia um pensamento de dar continuidade ao traçado das ruas do novo loteamento, aproveitando as ruas já esboçadas ou existentes no Patrimônio dos Pereira.
Mas consta também que a necessidade maior era reservar área, no espigão, para a passagem da linha férrea, que vinha avançando desde a cidade de Piratininga, ou seja, preparar o terreno para a chegada do progresso puxado pelas locomotivas. 
Tem outro detalhe curioso na história - para dar continuidade ao traçado já existente, o engenheiro Durval de Menezes, batia as estacas como balizamento e ponto de origem do novo traçado, seguindo as ruas dos Pereira, porém, ato contínuo, os responsáveis pelo loteamento Alto Cafezal arrancavam as estacas e o serviço era perdido. Essa pendenga entre os Pereira e Bento de Abreu, foi motivo de carta do Sr. Bento de Abreu, relatando os fatos e pedindo providências do Sr. Pereira, segundo consta, carta que está exposta no Museu Municipal da cidade.


Diante do impasse e da imperiosa necessidade de continuidade dos trabalhos e ainda resguardar uma longitudinal para acolher os trilhos, o “casamento” dos projetos foi preterido e cada um seguiu o seu caminho. Daí, entre outras, a Rua Bahia, não ter continuidade com a Rua Cel. Galdino de Almeida, a rua Maranhão, terminar na Rua Sampaio Vidal, onde também começa a Rua Dom Pedro, e a Rua Nove de Julho, esta sim, ter a continuidade entre os dois lados, porém com uma bela curva bem na região central. 
Resposta sobre o assunto para um repórter 
No passado, trilhos no centro da cidade, sinônimo de progresso, no presente, na verdade desde 1960, trilhos e passagem de trens, de carga ou de passageiros, já significavam problemas das mais variadas ordens. Ao fazer uma pesquisa nos jornais de época encontramos várias notícias de atropelamentos com vítimas fatais, notas sobre a fila de espera prolongada dos veículos que circulavam pelas ruas. Explico.
Os trens de carga eram imensos e geralmente vinham carregados de grãos, de madeira ou de gado, oriundo da cidade de Panorama. Quando chegavam em Marília, era preciso fazer a manutenção, as manobras e a troca de locomotivas. Alguns destes comboios, fechavam, ao mesmo tempo, a passagem da Rua Nelson Spielmann, da Rua Paraná e da Rua Nove de Julho. Não havia como passar de um lado para outro, parava tudo, era um buzinaço só, pessoas irritadas, e alguns mais impacientes arriscavam a vida passando sob os vagões. 
Os primeiros cruzamentos eram sinalizados e protegidos por porteiras de madeira. No cruzamento da Nelson Spielmann, atrás do Matarazzo, ficava uma casinha de madeira na cor cinza, onde um vigia recebia o sinal telegráfico da passagem do trem pelo Distrito de Padre Nóbrega, e fechava a porteira para bloquear o trânsito de veículos. O mesmo acontecia nos cruzamentos seguintes, ou seja, tudo dependia da ação direta do homem, nada era automatizado.
Destas observações entendemos também o traçado de outras ruas, que começam quase que paralelas e acabam se encontrando. É o caso da Avenida Sampaio Vidal, que se encontra com a Rua São Luiz, da Rua Quatro de Abril (era aberta até o final), que se encontrava com a Sampaio Vidal, da Rua Bahia, com a Rua Goiás, da Rua Independência, com Rua Sargento Ananias, e de tantas outras. 
Há também varias ocorrências de ruas “sem saída”. Fiz um trabalho de pesquisa sobre estas ruas em Marília e me surpreendi com a quantidade existente.  
De 1924 a 1930, Marília entrou no mapa da migração atraindo gente vinda do Nordeste, somando número com os imigrantes japoneses, com os sírio libaneses, com os italianos e os portugueses, sendo estes últimos, os maiores trabalhadores na lida de serraria, produzindo tábuas, vigas e palanques para erguer as primeiras moradias. Andando pelas ruas da cidade, mesmo próximo ao centro, encontramos várias casas de madeiras. 
Conta a história que com uma só arrancada derrubaram mais de 12.000 alqueires de matas e plantaram, quase de um só fôlego, mais de vinte e quatro milhões de pés de café. Tem noção do que é gente trabalhando? Isto foi pelas bandas da Fazenda Ventania, hoje, nossa querida Nova Marília, o bairro mais populoso da cidade.
Publicado no Jornal Diário de Marília, em 17/05/2015

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Retratos de uma sociedade

Tenho certo receio de fazer estas incursões pelo campo da sociologia e da psicologia, pois sou ciente de que é preciso muito conhecimento para poder engendrar argumentações e comentários, sem cair no deslize das incoerências. Refiro-me a esta situação dos seres humanos que não conseguem viver na chamada sociedade organizada.
A cracolândia, na capital paulista, foi cenário recente de confronto que envolveu policiais, a guarda municipal, a população e os viciados, protagonistas de uma “nova” sociedade alternativa. Montam barracas improvisadas e, ali, passam o dia consumindo drogas, jogando conversa fora, “viajando” e vivendo na “terra do nunca”.
Para amenizar o impacto social, e também ambiental, devido ao lixo e ao odor fétido das necessidades básicas, feitas em locais inadequados, a prefeitura estabeleceu horários para lavar a calçada.
E olhem só que interessante. Eles, os alienados, assim chamados, levantam acampamento no horário estabelecido, aguardam a varrição e a lavagem e, depois, retornam com toda a tralha. Isto é sinal de que ainda resta um fio de esperança no caos, pois mesmo vivendo sob condições muito precárias aceitam a assepsia material para ter um mínimo de conforto.
Mas a tendência é só aumentar a população desses seres infelizes, neste caso, atraídos por um interesse comum, o de consumir drogas sem serem molestados. Como nos filmes futuristas, criaram um território neutro, uma zona franca, dentro da sociedade, supostamente organizada, onde são acolhidos para gerar mais lucros. Sim, sempre há os que ganham com a miséria humana, os que controlam o meio.
Toda vez que a polícia interfere neste ambiente surrealista, vira uma bagunça maior do que já está. O comando diz que tem que fazer alguma coisa para mostrar serviço, para dar uma resposta para a sociedade. Porém, diz aos seus comandados que tomem muito cuidado com a forma do fazer.
Se desandar a operação, não foi o comando quem mandou, o ônus fica por conta de quem estava lá, na ponta dos fatos. O problema é que conversa e conselhos, a curto prazo, não são eficazes.
Como moeda de mediação e troca, o comando oferece moradia, hotel pago e emprego, mais o acompanhamento da assistência social para que saiam desta condição de vulnerabilidade. Mas acaba sendo algo paliativo; os assistidos preferem as ruas, em vez alguns lençóis limpos e uns trocados por serviços prestados. Em pouco tempo, estão de volta.
O caso mais recente, do ator que interpretou o personagem Neguinho, no filme “Cidade de Deus”, mostra esta realidade. Foi descoberto como frequentador da cracolândia, vive numa luta constante contra a dependência química. Na entrevista que deu à Folha de São Paulo, disse: “Eles viraram minha família, porque não fui acolhido pela minha família de sangue”.
Aqui em Marília, nossa terra, Símbolo de Amor e Liberdade, não é diferente. Nossas cracolândias, por enquanto, estão restritas a algumas favelas ou pontos mais distantes da nossa vista. Estão mais próximas das biqueiras das drogas. Já tivemos uma ameaça, bem no centro da cidade, mais precisamente na antiga estação ferroviária, coibida a tempo, utilizando os caminhos permitidos pela lei, associados à limpeza e manutenção do local, o reforço na iluminação e o policiamento constante.
Mas estamos vivendo um outro movimento, os do sem teto, moradores de rua que se recusam a fazer parte de qualquer programa de reintegração social, como, por exemplo, o da Fumares – Fundação Mariliense de Recuperação. Eles não podem ser levados à força, não podem ser despachados para outras cidades, não podem ser presos, ao menos que cometam algum delito. Restam a conversa, o convencimento pela insistência da assistência.
São seres humanos que estabeleceram para si o mínimo do mínimo, a vida da unidade: um prato de comida ao dia, um corotinho de cachaça, um cobertor, geralmente fruto de doação da sociedade, e um lugar qualquer para dormir. Sem horários para cumprir, sem agenda, sem compromisso com nada e com ninguém, sem futuro, apenas o presente. É o tal do “Eu” profundo, tomando decisões que os levaram a optar por este tipo mísero de vida.
Ivan Evangelista Jr. é gestor de negócios com especialização em Marketing e Negócios Estratégicos pelo Univem. É chefe de gabinete e gerente de marketing da Fundação Eurípides/Univem, fotógrafo, articulista e pesquisador pela Comissão de Registros Históricos de Marília. Autor do primeiro Guia de Roteiros Turísticos de Marília.
Publicado na Revista D Marília, edição julho/agosto 2015

domingo, 14 de junho de 2015

A Estação Ecológica de Marília (Decreto nº 56.615, de 28 de dezembro de 2010)

O amigo Leonel Nava me questionou se sabia da existência de uma Estação Ecológica em Marília.  Fiz algumas pesquisas e encontrei informações a respeito do assunto, que também me surpreendeu, visto que por se tratar de informação relevante poderia estar mais difundido.
Vista parcial da área














No site Wiki Aves (http://www.wikiaves.com.br/areas:esec_marilia:inicio) consta:  “A Estação Ecológica de Marília é uma unidade de conservação de proteção integral situada no município de Marília, Estado de São Paulo, que possui área de 607,14 hectares e “tem por objetivo a preservação dos ecossistemas e processos ecológicos, em zona de grande relevância ambiental, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação
Antiga placa orienta visitantes
ambiental em contato com a natureza” (Artigo 2º do
Decreto nº 56.615, de 28 de dezembro de 2.010).A vegetação predominante é do tipo Floresta Estacional Semidecidual, em cujo interior situam-se nascentes que compõem o manancial da Bacia Hidrográfica Aguapeí-Peixe.“Os estudos geográficos do município de Marília apontam que a cidade está em toda sua extensão situada sobre o ramo ocidental da Serra dos Agudos que a atravessa de leste a oeste (englobando inclusive os municípios vizinhos). Os rios então, nascem nestas serras e fluem para dois lados: norte (para o Rio Aguapeí) ou sul (para o Rio do Peixe). A região tem pouca vegetação nativa, há predomínio de campos abertos e vegetação rasteira”
Adicionar legenda
Em outro site encontrei mais estas informações:  A Estação Ecológica de Marília permitirá aumentar a proteção ambiental na região. O nível de preservação atual do território é de cerca de 6,5%, índice inferior à média do estado (17,5%).O local fica ao norte do município e detém animais e plantas ameaçados de extinção. De acordo com a Secretaria do Meio Ambiente, a medida também pode estimular a pesquisa ambiental em Marília já que há forte presença de universidades na região.
O assunto se tornou curioso e me incentivou a organizar uma expedição in loco para conferir de perto todo este contexto. Assim, no dia 13/06, me dirigi até a área mencionada, área esta conhecida de muitos marilienses como Fazenda do Estado.
De fato o nível de preservação é muito baixo, áreas enormes de pastos, quase nada de vegetação nativa e o vento não encontra barreiras naturais na região. Mesmo próximo da
ponte do Rio Tibiriça, onde muitas vezes pesquei Lambarís e Mandís, as áreas verdes existentes são aglomerados de plantação de eucaliptos ou de pinus, árvores introduzias na paisagem com vistas a cessar a ação danosa do assoreamento e da erosão.  Ainda que verdejantes, o cenário geral é muito artificial.
Passando pela sede da antiga Fazenda do Estado, seguimos sentido às margens do rio, o que não foi possível porque encontramos porteiras com cadeados que interromperam o caminho. Um fio de mata nativa pode ser observado nesta trajetória, o que pode ser acompanhado pelas imagens aéreas do Google.
O terreno é marcado pelo afloramento de rochas na estrada de chão, com sinais de calcário e muita areia. Aqui ou ali um capoeirão de cana-de-açúcar que certamente deve servir de complemento para a ração do gado. Poucas árvores nativas, entre elas, paineiras, farinha seca, a ficheira e na beira do rio, de longe, avista-se a forte presença da sangra d’água, o que pode ser um fio de esperança neste cenário promissor.
De certo ponto da estrada pode-se observar no horizonte a cidade de Marília, um privilégio proporcionado pela curiosa condição geográfica do terreno regional. 

Concluindo. Se a ideia é fazer da área uma Estação Ecológica, é preciso agilizar providências no sentido de criar uma conscientização mais sistêmica entre os pequenos situantes da região, entrar, forte, com educação ambiental nas escolas que as crianças ali moradoras frequentam, incentivar o plantio de espécies nativas, de portes variados, bem como de frutíferas, para contribuir na atração de pássaros e a fauna silvestre.   

Ivan Evangelista Jr, membro da Comissão de Registros Históricos de Marília, fotógrafo e pesquisador.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Eu amo rádio

Olá meus amigos, quanto tempo sem postar por aqui! Saudades de todos.
Quem me conhece sabe que rádio é uma das minhas paixões, por consequência, a radioescuta também faz parte das atividades que geram endorfina.
As rádios Ondas Curtas (OC) são aquelas rádios que transmitem lá de longe e que a gente pode sintonizar aqui em Marília, como por exemplo: a Rádio Japão, Rádio Havana de Cuba, Rádio Nacional da Amazônia, com quem temos uma cumplicidade de amizade com a equipe da apresentadora Beth Begonha e o seu/nosso programa diário "Amazônia Brasileira",a rádio Inconfidência, lá das Minas Gerais, a Rádio Aparecida, Rádio Anhanguera e a Rádio Cultura de São Paulo, onde o jornalista e apresentador Salomão Schwartzman nos brinda com o saudável programa "Diário da Manhã  - Diariamente necessário".
Neste contexto fiz muitos amigos, gente que tem a mesma paixão por rádios e pelas ondas curtas; gente de perto, e de longe, como por exemplo o Célio Romais (http://www.romais.jor.br/blog/), lá da grande Porto Alegre, o Ulysses Galleti (http://www.aminharadio.com/radio/ulysses_escuta), de Itatiba, o João Salvador, o José Ricardo Bedendo e, aqui em Marília, o Sr. Leonel Nava, pai do paleontólogo Wiliam Nava, sendo o sr. Leonel um dos radioamadores mais ativos e que ainda domina a comunicação por telegrafia.
Ulysses Galleti

- Mas tem que se comunique por telegrafia ainda Ivan, você deve estar se perguntando.
- Sim, muita gente utiliza a telegrafia, mais do que imaginamos e, com frequencia, ouço do Sr. Leonel relatos de contatos com capitães e operadores de rádio dos navios que estão por águas deste mundão de meu Deus. Mas se a questão é modernidade, saibam que o Sr. Leonel está pesquisando as ondas das rádios FM (Frequencia Modulada) e já tem uma lista de emissoras que conseguiu sintonizar em sua residência, aqui em Marília, transmitindo de lugares muito distantes. 
O mais comum nas residências
Qual equipamento se utiliza para fazer as escutas de rádios em OC? De preferência aqueles mais antigos, rádios a válvula, lembra? Mas a brincadeira à parte, fora estes, rádios mais modernos que possuem no dial a indicação de recepção em OC. Esta informação geralmente está impressa no painel do rádio, naquele botão que tem várias opções: OM, OC, e FM, sendo estes os mais simples de operar.
O que mais? - Uma antena feita com fio de cobre descascado, dividida em duas partes (dois polos), separados por um material isolante e ligados ao rádio receptor por um cabo ou fio. Nos receptores você vai encontrar a entrada para a conexão com a indicação "antena externa".
Toda esta introdução para dizer que hoje eu tive a grata surpresa de receber a indicação de um vídeo do Youtube em que uma empresa fez um comercial para o dia dos namorados resgatando a Radionovela. Lembra disso? As radionovelas foram sucesso, antes da chegada das telenovelas. Para produzir as novelas de rádio, toda uma estrutura era montada nos estúdios para simular sons e cenários mentais que levassem os ouvintes a viver a situação como se estivesse assistindo uma peça de teatro.
A folha de zinco simulava o som dos temporais, o milho, ou arroz, jogados sobre a mesa lembravam o som da chuva, duas partes de um coco, batidas sobre o assoalho, traziam a imagem da cavalgada, uma porta do próprio estúdio, meio emperrada, ajudava no som para simular a entrada de alguém "em cena", e assim, a criatividade dos autores e assistentes de estúdio não tinha limites. 
O resultado sempre dos melhores, geralmente, a janta era servida e o rádio ligado, instalado em local nobre da casa, ou sobre o sobre o itajer, peça parecida com uma cristaleira, onde se guardavam pratos, talheres e outros acessórios. 
Olhos e ouvidos bem atentos e o espetáculo se iniciava com a música que marcava a entrada dos atores na maioria dos lares brasileiros. Um silêncio absoluto, corações e ouvidos atentos; a cada frase interpretada com maestria e talento, suspense, emoção, total absorção dos sentidos. No final, a chamada para o dia seguinte: "e não percam o capítulo de amanhã, Rosinha vai dizer a Afrânio que não quer mais casar-se com ele, seu pai insiste, afinal, Afrânio é um bom partido e também funcionário de carreira do Banco do Brasil e ainda está estudando para ser advogado..."
Na atualidade tenho conhecimento de radionovelas produzidas apenas pela Rádio Nacional da Amazônia, que aliás, utiliza-se deste expediente para fazer campanhas sociais ou tratar de temas relevantes para as comunidades ribeirinhas, ou para "o povo da floresta" como chamam carinhosamente a população da nossa querida grande Amazônia.
Ao ver o filme da propaganda atual (https://www.youtube.com/watch?v=uk4eZ8bJiMs) todas estas memórias pularam do meu inconsciente de forma automática. A produção foi muito feliz, utilizou recursos modernos para ilustrar um sucesso do passado e trazer aos teleinternautas um misto de rádio e televisão com certa dose de saudosismo e muita criatividade.
Minha sugestão é: veja o vídeo completo na primeira vez, aproveite cada detalhe visual. Depois, ponha para rodar novamente , aumente o volume e feche os olhos. Ouça a narrativa completa novamente, volte ao passado e curta o presente.
Ah! E se você tem em sua casa um rádio destes mais antigos, aquele que guarda com carinho porque foi do seu pai, do avô, ou mesmo porque faz parte da sua história de infância e ele não funciona mais, manda lá para a Oficina do Rádio Antigo, na cidade de São Carlos, do amigo Indalécio de Oliveira
Indalécio  de Oliveira
(
http://officinadosradios.blogspot.com.br/). É restaurador nota 1.000, tanto que está com a agenda fechada para 2015, faz um trabalho fantástico. Entre no blog que passei o link e curta cada uma das histórias de recuperação, tudo ilustrado com fotos e com narrativas das mais hilárias.
Ouvir rádio é o melhor remédio, faz bem para a alma e para os sentidos. Desde que me casei mantenho ao lado da cama um dos rádios da minha pequena coleção e ligo assim que me deito para dormir.
No começo, minha esposa até estranhava, mas depois de anos de boa convivência e cumplicidade matrimonial, se me deito e me esqueço, logo vem a pergunta: - não vai ligar o rádio?
Boas escutas meus caros leitores. O link para a rádionovela "Pedaladas da Paixão" da propaganda é 

https://youtu.be/uk4eZ8bJiMs

contatos: evangelista@univem.edu.br 
       


     

segunda-feira, 16 de março de 2015

A Rua Dom Pedro

Vista geral da rua Dom Pedro
Representando o marco de uma fase de ascensão econômica do município, na Rua D. Pedro, nº 87, está o casarão da família Schelini. Faz parte do traçado do antigo loteamento dos Pereirinha, tem seu início na Av. Sampaio Vidal, via que é o marco entre a história do patrimônio Alto Cafezal e das novas terras de Bento de Abreu.
Dona Rosa de Toledo, fotógrafa, membro honorária e madrinha do Fotoclube "Sebastião Carvalho Leme", foi moradora do Edifício Clipper durante muitos anos. Em uma das visitas que lhe fiz ela me contou que da janela do seu apartamento produziu belas fotos da cidade.  


Rosa de Toledo Cesar
Vaidosa por natureza, sempre com o cabelo bem penteado e batom nos lábios, nos finais de tarde, se arrumava toda e se debruçava no peitoril para apreciar o movimento. "Gosto de ver o trânsito, o movimento das pessoas saindo do trabalho e voltando para suas casas. Quando chove, as sombrinhas abertas, deixam as ruas mais coloridas e tudo me inspira a fazer novas fotos. Amo esta cidade", relatou emocionada.
A Rua Dom Pedro começa na Sampaio Vidal e termina na Rua Santa Cecília. Nos últimos quarteirões eu contei umas 6 casas de madeira que resistem ao tempo e às mudanças, casas com jardins e trepadeiras adornando a fachada, com senhoras regando plantas com a mangueira e com aquele ar saudável dos anos passados.
Ao contrário de outras ruas mais antigas, esta já ganhou novas edificações com estilos de modernidade e os imóveis que não foram modificados arquitetonicamente receberam adaptações para abrigar pequenos negócios. A rua é muito movimentada, o fluxo de veículos é intenso, sendo este um dos fatores para a atração dos empreendedores.
Durante a visita para reconhecimento e levantamento de mais dados, uma senhora caminhava acompanhada pela calçada e me despertou a atenção, pela discrição e harmonia da sua vestimenta e pelo fato de contar com o auxílio de uma bengala, de forma muito elegante. Eu estava fotografando nesta quadra um poste de iluminação pública, localizado defronte as residências dos irmãos Virgílio e Roberto Cavallari , poste daqueles mais antigos, confeccionado artesanalmente em ferro, pela razão de ser um dos poucos que restam na cidade.
Ao se aproximar ela me perguntou se estava fotografando para anúncio de venda da casa. Expliquei que não e me apresentei como pesquisador e cronista da Comissão de Registros Históricos de Marília. "Ah, eu leio os seus artigos aos domingos, gosto de rever as fotos e resgatar as histórias, nasci em Marília, meu pai foi o senhor Abrão Pedro Badiz, proprietário de comércio de secos e molhados localizado na esquina da Rua Nove de Julho, com a Rua São Luiz, depois ele vendeu e mudou-se para Rua Barão do Bananal (hoje Cel. Galdino de Almeida), onde montou a Casa Damasco."  
A Sra. Lourdes Badiz mora na Rua Dom Pedro, desde 1977, em casa construída pelo pai. São três imóveis, tinham a mesma configuração arquitetônica, feitos um para cada filho, conforme mandava o costume de época. Dona Lourdes dedicou parte de sua vida ao convento, na comunidade do Sagrado Coração, deixando a vida religiosa para cuidar dos pais. Quando nos encontramos estava retornando da missa, trazia o semblante de felicidade plena.
Das minhas lembranças sobre esta rua resgato o forte cheiro do couro que emanava da loja Selaria São José, esquina com a Rua São Luiz, dos irmãos Wilson e Moacir. Nas grandes portas verdes, desbotadas pelo tempo, eram pendurados os acessórios mais vendidos para o pessoal da roça e do campo, desde arreios para lida com animais, chapéus, cintos e botinas que lustravam ao sol da tarde.
Nas vitrines ficavam expostas as armas de caça, as cartucheiras, cano duplo, paralelo ou remontado, os revolveres das Marcas Rossi e Taurus, os cintos para cartuchos, acessórios para manutenção do armamento, as camisas em padrão xadrez e as calças rancheiras. O movimento era intenso no pedaço, o pessoal vinha da roça para fazer a compra do mês na Casa São Jorge, ficava do outro lado da rua, e já aproveitava para conhecer as novidades da Selaria, para comprar pólvora e chumbo e trazer algum material para reparo. No rádio o anúncio criativo dizia assim: "A cavalo ou a pé Selaria São José".
O casarão permanece altivo no terreno nobre, ganhou dois prédios vizinhos que lhe furtaram a o sol das manhãs e hoje abriga concorrido estacionamento para veículos, um Oasis no meio urbano sufocado pela frota que não para de crescer. Duas jabuticabeiras parecem guardar a memória dos risos e brincadeiras de crianças de outrora.


Ivan Evangelista Jr, é membro da Comissão de Registros Históricos de Marília
Publicado no Jornal Diário de Marília, em 15/03/2015

segunda-feira, 9 de março de 2015

Semiótica da urbanidade

Pesquisando uma boa definição para o que chamamos de cidade, encontrei esta aqui: “meio geográfico e social caracterizado por uma forte concentração populacional que cria uma rede orgânica de troca de serviços administrativos, comerciais, profissionais, educacionais e culturais”. Pois bem, esta questão da rede orgânica é o que me cativa, que me instiga a escrever e, cada vez mais, a observar e a buscar entender as transformações.  
É nato do ser humano dizer que pertence a um grupo, a uma tribo. Creio que é inerente à necessidade de inclusão social que todos nós carregamos em nosso DNA. Diz a história que ninguém nasceu para viver sozinho; mais cedo, ou mais tarde, a aproximação de outro ser acontece, ainda que a primeira experiência seja com um cachorro ou outro bicho de estimação.
Como organismo, a cidade tem seus tempos e fluxos, ainda que não formalmente estabelecidos, porém, com uma intensidade que parece seguir um roteiro previamente traçado. Outro ponto que estimula estas incursões mentais é ver que o ontem e o hoje convivem em harmonia no mesmo espaço, ainda que muitas vezes de forma disfarçada.
Se há alguma dúvida quanto a isto, é só procurar ver o que está por de trás das grandes telas coloridas que enfeitam as lojas e escritórios. Na maioria dos casos, as fachadas são originais, sendo que muitas guardam letreiros de atividades comerciais que existiram nos primeiros tempos da história. Fiz um tour pelo centro comercial e, neste exercício fotográfico, tirei a linha dos olhos da horizontalidade cotidiana. É impressionante o que se descobre quando desdobramos a visão buscando ângulos diferentes.
Soberano em épocas passadas, o anúncio do tradicional “Café Propheta” pode ser visto na face oeste de prédio histórico na Avenida Sampaio Vidal com a Rua Nove de Julho, disputando espaço e atenção com as modernas operadoras de serviços de telefonia e Internet.  Na mesma Nove de Julho, dirigindo o veículo, ou caminhando, no sentido centro-bairro, uma das boas vistas que temos são as torres e os vitrais da Matriz de Santo Antônio. Mas, com o passar dos anos, entrou um outro elemento geométrico na paisagem, um enorme carretel de linha, o que gerou uma espécie de tela modernista quando se congela a paisagem.
Este exercício fotográfico me proporcionou uma releitura urbana pela semiótica, a ciência geral dos signos que estuda os fenômenos de significação, onde velhas e novas fachadas, letreiros e ornamentos, cortes e recortes, constroem uma via de interpretação visual que transcende à plasticidade dos cenários. 
Um edifício é uma solução urbana que contempla a moradia de várias pessoas, ou de escritórios funcionais, em um conjunto de pequenos ou grandes espaços organizados na forma vertical. Porém, não é errado dizer que ali está uma pilha de pessoas, gente amontoada em cima de gente, separadas por lajes e paredes, fazendo coisas diferentes para pessoas diferentes. 
E isto já me leva a comentar uma outra modernidade esquisita, que é a possibilidade de comprar o espaço aéreo vizinho. Um dos recursos de marketing na venda de torres comerciais ou residenciais é o apelo sensorial e emocional para a “boa vista” que o comprador terá a partir da sua janela ou sacada. Ora, se uma nova construção for erguida e tirar esta “paisagem paradisíaca”, a razão sensorial da compra deixa de existir. Alguns prédios da área central de Marília já perderam parte da vista privilegiada dos vales e itambés, assim como perderam a brisa fresca que acompanha ou anuncia a chuva. Qual o valor tangível, ou o intangível, desta sensação para os habitantes ali empilhados?
Em outro momento, pelo recorte da lente, podemos nos transportar momentaneamente para terras distantes e místicas. A simbologia arquitetônica tem muito disso e, de forma quase que automática, aciona recursos lúdicos mentais que se ancoram em experiências e na memória visual que guardamos de locais visitados.
Em vários pontos da cidade, é possível encontrar sinalização que previne os transeuntes sobre o cruzamento de via férrea. Se o aviso do cruzamento soa estranho na atualidade, pois este tipo de transporte há muito deixou de existir, a placa anexa - “Pare, Olhe e Escute” - é mais atual do que imaginamos ser. Explico o porquê.
Se queremos realmente conhecer o meio em que vivemos, é preciso utilizar os sentidos de que dispomos para captar as informações que jorram aos montes. Para interpretar a cidade, é muito importante saber ouvir os seus sons, saber olhar a sua performance geométrica e assimétrica, saber aspirar e expirar seus aromas e fedores, conhecer e entender seus personagens mais comuns e os anônimos.
É neste sentido que compartilho estas crônicas, as quais me são uma ferramenta de aprendizado constante.  

Publicado no Jornal Diário de Marília em 08/03/2015

segunda-feira, 2 de março de 2015

Rua Paulino da Silva Lavandeira, a “rua do Cocó”

Era quarta-feira de Cinzas. A cidade começava a se preparar para reassumir o expediente a partir das 12 horas. Deixei o carro estacionado no jardim, aproveitando as vagas que estão bem em frente à farmácia São Bento. Dia quente, antes do almoço caiu bem um picolé de fruta. 
Sentei-me em uma daquelas mesinhas, ao lado dos trailers. Na praça tem trailer que faz suco de guaraná natural, tem outro que serve salgadinhos, com destaque para o charutinho de carne moída com ovo picado e bastante cheiro-verde, tem a banca de jornal e ainda tem garapa geladinha.
Praça São Bento
Esse ponto da Rua Nove de Julho foi batizado de Asilo Santa Rosa, pelo colega Rubens Coca Ramos, também faz parte da Comissão de Registros Históricos. É uma brincadeira que ele faz com os amigos, todos na faixa etária da melhor idade, frequentadores assíduos do local, aproveitando a sombra boa, mais a cervejinha gelada.
Feita a localização geográfica, retorno ao causo ocorrido. Foi ali que um senhor moreno , desceu de um veículo e se aproximou da mesa perguntando: - “É aqui que eu encontro o Cocó?” O Gonzaga sapateiro deu atenção ao cidadão e respondeu que o requisitado estava impossibilitado de  bater ponto na roda há algum tempo, em razão de um tratamento de saúde.
- “Mas ele está bem?”, insistiu o estranho. 
- “Sim, não é nada muito sério. Até ontem mesmo estava com a gente por aqui, é só uma questão de tempo e ele volta.”
Eu, ali, de banda, mas de ouvido comprido na conversa alheia e as antenas ligadas.  Alguma coisa me dizia que deste mato ia sair coelho, e dos graúdos.
A conversa continua: - “Eu preciso falar com o Cocó, sou ex-jogador do São Bento, estou passando o Carnaval em Marília e quero agradecer a ele por tudo que fez por mim.” 
Na roda, um japonês, muito falante, encarou o sujeito e perguntou: - “Você é o Amauri?”
- “Isto mesmo. Depois de muitos anos morando em Santos eu aproveitei o feriado para vir dar um abraço de gratidão no Cocó.”
Confesso aos amigos que em matéria de futebol eu sou semianalfabeto. Sabia que era receita de bom caldo, mas não fechava as pontas na conversa.
Trocadas algumas palavras, deram a ele o rumo da casa do personagem solicitado, apontando lá pelas bandas da Praça Athos Fragata, nas  imediações de um supermercado que já foi da família Moura. 
Imaginei que o visitante teria dificuldades para chegar lá, pois o trânsito na região tinha acabado de passar por mudanças. Era a desculpa que eu precisava para meter a colher em cuia alheia, tudo por uma boa história.
 - “Deixa que eu levo vocês até lá”, me intrometi na conversa e já solicitei que me acompanhassem.
Seguindo o rumo das informações, chegamos na Rua Paulino da Silva Lavandeira, quase esquina com a Rua Comendador Abel Augusto Fragata. Perguntamos a um grupo que estava por perto e a resposta foi objetiva. - “É a casa da frente, é só bater e chamar o Cocó”.
Nesta altura dos fatos, o Amauri da Silva já não cabia nas próprias emoções, parecia criança, se pendurou no grande portão e chamou insistente pelo amigo. Ele estava acompanhado da filha, que fez o comentário: - “Ele está eufórico assim desde que saímos de Santos, se não viéssemos aqui hoje seria uma grande decepção.”
Amauri entrega para Pupo Gimenez a lista dos clubes onde jogou 
O portão se abre o reencontro acontece. Ele abraça o velho amigo e quase desaba em lágrimas. Segura o quanto pode, passa a mão sobre os olhos, tenta disfarçar, não consegue. 
 - “Você está lembrado de mim?”, perguntou. 
Ao seu lado estava nada mais, nada menos do que Antonio Pupo Gimenez, o Cocó, treinador de futebol muito conhecido dos marilienses e dos brasileiros. Amauri sacou do bolso uma folha de papel com anotações dos times em que atuou e disse que veio até Marília, primeiro, para agradecer ao treinador pelo incentivo que dele obteve quando mais precisou, ao começar a carreira no São Bento. Segundo, para prestar contas e dizer que havia dado tudo certo e era questão de orgulho prestar esta homenagem. 
De Marília, em 1961, partiu para o Guarani, depois jogou o Campeonato Sul Americano pela CBF, passou pelo Flamengo e por outros times: Futebol Club Porto/Portugal, Santos Futebol Clube, XV de Piracicaba, Bangu e América/RJ, Barons de Ferplex/Washington-DC-USA, Atlas/Guadalajara-México, Puebla/México, até 1976.
Ficamos ali reunidos por uns 30 minutos: Amauri, vestido com a camisa 10 do Santos, eufórico, seu sonho havia se realizado. O Cocó, ou melhor, o Sr. Treinador Pupo Gimenez, uma simpatia de pessoa, da mesma forma estava emocionado, não esperava que a sua quarta-feira de Cinzas lhe reservasse uma surpresa deste tamanho. Passados 54 anos um de seus pupilos vem lhe dizer obrigado pela confiança e apoio. 
São Bento, campeão de 1967
E eu também, que antes pensava que o melhor do dia das Cinzas seria um sorvete de uva na sombra. 
É como dizem: Quem procura sempre acha, se não um prego, uma tacha.

Publicado no Jornal Diário de Marília, edição de 01/03/2015

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A escolinha da Associação dos jornaleiros de Marília

O garimpo sobre a origem dos nomes de ruas e personagens sempre é muito gratificante. Por muitas vezes, começo tendo apenas o nome da rua e uma única referência, um fio para puxar a meada, e a partir dali buscar outros fatos e registros que possam ajudar na composição geral. Foi assim com a produção do artigo sobre as ruas onde ainda há pessoas que fazem consertos à moda antiga.
Num tempo em que os caminhões tipo baú são a grande maioria da frota de transporte rodoviário, foi interessante encontrar um consertador de lonas, lá na Rua Prudente de Moraes, na subida, sentido da Igreja Matriz de Santo Antônio. Passando por ali, pouca gente pode imaginar que um bom trecho da nossa história está guardado em uma pasta de couro, entre lonas e máquinas de costura.
Sr. Antonio Lopes Neto
Fui lá, de forma despretensiosa, esperando registrar mais um artesão, entre tantos que estão espalhados pela cidade. O Sr. Antônio me atendeu enquanto acompanhava o funcionário Paulinho, fazendo marcações em uma grande lona amarela para fixação de ilhós de amarração.
Antes das lonas, ele trabalhou “para os padres", expressão que repete com alegria, contando sua vinda para Marília, para ajudar na finalização da cúpula da Matriz de Santo Antônio. É um faz de tudo, na expressão popular, é gente que se vira; se não dá aqui, corre pra lá, e vai vivendo a vida e ganhando o pão de cada dia.
Contou que costurava sacaria quando os caminhões de amendoim e algodão lotavam as imediações da indústria Matarazzo, na Av. Castro Alves. Comprava a sacaria, fazia os reparos necessários e já passava pra frente. Com isto, mantinha suas economias em ordem.
Depois de um certo tempo e com o início da modernização da indústria, os caminhões passaram a ser do modelo graneleiro. As cargas, antes expostas ao tempo durante o transporte, precisavam ser mais protegidas, preservando os grãos e o algodão da umidade excessiva, o que implicava na perda de qualidade e maior demora no processo de transformação.
As enormes lonas, chamadas de encerados, cobriam as cargas ou forravam as carrocerias. No movimento de cobre e descobre, se enroscavam nos ganchos, nos parafusos ou pregos. Assim, os reparos dos rasgos foi uma segunda opção para ampliar os serviços prestados.Comprou o lote e começou ele mesmo a construção da nova sede da empresa; fez tijolo por tijolo, ergueu as paredes e armou o madeiramento da cobertura.
Foi neste mesmo período da história que os padres convidaram Antônio para assumir a coordenação da Escolinha da Associação dos Jornaleiros de Marília. A entidade beneficente funcionava em prédio localizado na esquina das ruas Paes Leme e Bonfim.
Atendia cerca de 60 crianças da comunidade, promovendo a educação e a cidadania, bem como os preparando para atuar como aprendizes nas oficinas do comércio da cidade, muito comuns neste período. Em uma das fotos que nos mostrou, aparecem os engraxates, todos devidamente uniformizados, com belas caixas de trabalho, feitas por eles mesmos.
Antônio fez questão de ressaltar que o sistema era rígido, e para continuar na escolinha dos jornaleiros, o aluno precisava seguir as regras, ser amigo e fazer os trabalhos conforme as instruções. "Muitos pais iam para o serviço e deixavam seus filhos aos nossos cuidados. A minha contribuição era a formação técnica profissional, e os padres cuidavam da educação espiritual, sempre com a efetiva participação das famílias. A escola era uma extensão da igreja e da família", afirma com convicção.  
Neste contexto, destaca duas personagens, muito atuantes na educação destes jovens, pessoas a quem ele devota grande respeito e admiração. São as irmãs Marta e Nanci Feres, da mesma família do nosso querido Feis Feres, conhecido pela histórica atuação musical e pela "Tenda do Pai Thomaz", comércio instalado na Rua Armando Sales de Oliveira, desde 1960.
Ao mostrar o álbum de fotos, que ele mesmo tirou na época, vai apontando os garotos e dando os nomes com uma facilidade que impressiona. De cada um dos personagens, ele sabe a história de vida, menciona com orgulho expoente as atividades profissionais que exerceram ou ainda exercem. Ficou claro em nosso encontro que ele assumiu uma missão de vida, e cumpriu com todo o zelo e amor, ao lado de outras pessoas que a vida juntou neste capítulo.
A finalização da torre da igreja foi o pretexto do destino para provocar a sua mudança da cidade de Assis para Marília. Tem muitas histórias para contar e tem muitos amigos.

Ivan Evangelista Jr, é membro da Comissão de Registros Históricos de Marília

publicado no Jornal Diário de Marília, edição de 22/02/2015