Vista geral da rua Dom Pedro |
Representando o marco de uma fase de ascensão econômica do
município, na Rua D. Pedro, nº 87, está o casarão da família Schelini. Faz
parte do traçado do antigo loteamento dos Pereirinha, tem seu início na Av.
Sampaio Vidal, via que é o marco entre a história do patrimônio Alto Cafezal e
das novas terras de Bento de Abreu.
Dona Rosa de Toledo, fotógrafa, membro honorária e madrinha
do Fotoclube "Sebastião Carvalho Leme", foi moradora do Edifício Clipper
durante muitos anos. Em uma das visitas que lhe fiz ela me contou que da janela
do seu apartamento produziu belas fotos da cidade.
Rosa de Toledo Cesar |
Vaidosa por natureza, sempre com o cabelo bem
penteado e batom nos lábios, nos finais de tarde, se arrumava toda e se
debruçava no peitoril para apreciar o movimento. "Gosto de ver o trânsito,
o movimento das pessoas saindo do trabalho e voltando para suas casas. Quando
chove, as sombrinhas abertas, deixam as ruas mais coloridas e tudo me inspira a
fazer novas fotos. Amo esta cidade", relatou emocionada.
A Rua Dom Pedro começa na Sampaio Vidal e termina na Rua
Santa Cecília. Nos últimos quarteirões eu contei umas 6 casas de madeira que
resistem ao tempo e às mudanças, casas com jardins e trepadeiras adornando a
fachada, com senhoras regando plantas com a mangueira e com aquele ar saudável
dos anos passados.
Ao contrário de outras ruas mais antigas, esta já ganhou
novas edificações com estilos de modernidade e os imóveis que não foram
modificados arquitetonicamente receberam adaptações para abrigar pequenos
negócios. A rua é muito movimentada, o fluxo de veículos é intenso, sendo este
um dos fatores para a atração dos empreendedores.
Durante a visita para reconhecimento e levantamento de mais
dados, uma senhora caminhava acompanhada pela calçada e me despertou a atenção,
pela discrição e harmonia da sua vestimenta e pelo fato de contar com o auxílio
de uma bengala, de forma muito elegante. Eu estava fotografando nesta quadra um
poste de iluminação pública, localizado defronte as residências dos irmãos
Virgílio e Roberto Cavallari , poste daqueles mais antigos, confeccionado
artesanalmente em ferro, pela razão de ser um dos poucos que restam na cidade.
Ao se aproximar ela me perguntou se estava fotografando para
anúncio de venda da casa. Expliquei que não e me apresentei como pesquisador e
cronista da Comissão de Registros Históricos de Marília. "Ah, eu leio os seus
artigos aos domingos, gosto de rever as fotos e resgatar as histórias, nasci em
Marília, meu pai foi o senhor Abrão Pedro Badiz, proprietário de comércio de
secos e molhados localizado na esquina da Rua Nove de Julho, com a Rua São
Luiz, depois ele vendeu e mudou-se para Rua Barão do Bananal (hoje Cel. Galdino
de Almeida), onde montou a Casa Damasco."
A Sra. Lourdes Badiz mora na Rua Dom Pedro, desde 1977, em
casa construída pelo pai. São três imóveis, tinham a mesma configuração
arquitetônica, feitos um para cada filho, conforme mandava o costume de época.
Dona Lourdes dedicou parte de sua vida ao convento, na comunidade do Sagrado
Coração, deixando a vida religiosa para cuidar dos pais. Quando nos encontramos
estava retornando da missa, trazia o semblante de felicidade plena.
Das minhas lembranças sobre esta rua resgato o forte cheiro
do couro que emanava da loja Selaria São José, esquina com a Rua São Luiz, dos
irmãos Wilson e Moacir. Nas grandes portas verdes, desbotadas pelo tempo, eram
pendurados os acessórios mais vendidos para o pessoal da roça e do campo, desde
arreios para lida com animais, chapéus, cintos e botinas que lustravam ao sol
da tarde.
Nas vitrines ficavam expostas as armas de caça, as
cartucheiras, cano duplo, paralelo ou remontado, os revolveres das Marcas Rossi
e Taurus, os cintos para cartuchos, acessórios para manutenção do armamento, as
camisas em padrão xadrez e as calças rancheiras. O movimento era intenso no
pedaço, o pessoal vinha da roça para fazer a compra do mês na Casa São Jorge, ficava
do outro lado da rua, e já aproveitava para conhecer as novidades da Selaria, para
comprar pólvora e chumbo e trazer algum material para reparo. No rádio o
anúncio criativo dizia assim: "A cavalo ou a pé Selaria São José".
O casarão permanece altivo no terreno nobre, ganhou dois prédios
vizinhos que lhe furtaram a o sol das manhãs e hoje abriga concorrido
estacionamento para veículos, um Oasis no meio urbano sufocado pela frota que
não para de crescer. Duas jabuticabeiras parecem guardar a memória dos risos e
brincadeiras de crianças de outrora.
Ivan Evangelista Jr, é membro da Comissão de Registros
Históricos de Marília
Publicado no Jornal Diário de Marília, em 15/03/2015
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