domingo, 17 de janeiro de 2021

Goiabeiras da nossa infância

 

Era o sonho deles. Uma casa na árvore.


Demorou mas enfim eles conseguiram. E foi no sistema mutirão, cada um ajudou um pouco e o sonho se tornou realidade em quatro dias. Tudo vistoriado e acompanhado bem de perto pelas crianças.

Todo homem é meio macaco e não por menos dizem por aí que somos deles os descendentes. Subir em árvores é algo encantador, que o digam as goiabeiras e seus galhos que se transformam em espaçonaves voadoras e se embrenham pelo universo. Se tiver goiaba, verde ou madura, o serviço de bordo é completo.

Na lida com as madeiras eu me lembrei que meu pai tinha o queixo torto porque caiu de um abacateiro e bateu com a cara no chão. Naquele tempo remédio era caseiro, tomou chá de tudo quanto é erva para tirar a dor e esperou “voltar no lugar”. Tomou sopa  e mingau de aveia que chegou a ficar enojado. Demorou tempo passar para poder mexer a boca e mastigar algo mais sólido.

O rosto ficou meio fora do esquadro, mas os movimentos voltaram e isto era o que importava. Abacateiro é traiçoeiro, já a goiabeira é mais confiável e para quebrar um galho tem que ser muito peso. Na falta da goiabeira foi outra espécie que serviu de base para o clubinho dos meninos.

Dos meninos? Bem, eles até que tentam segurar a onda e insistem em não deixar as meninas subirem, mas sabe como é mulher contrariada, pior que enxame brabo de abelha. Pelo menos é o que dizem por aí; vai saber se é verdade?

S


Só sei que desde que o clubinho ficou pronto o relógio precisou espichar as horas do dia. Sobem a escada com suco e o lanche, descem com brinquedos, sobem com guarda-chuva, descem com martelo, sobem com balde de terra e descem com as unhas tão encardidas que dá até gosto de ver. Nada que um bom banho não resolva.

E as meninas? Elas sobem a escada, eles, fecham a porta. Não demora vem o grito: abre ou eu vou chamar a vovó. Elas sabem que as avós são advogadas natas para as  causas mais difíceis. Apelam na primeira, na segunda e em quantas instâncias forem necessárias.

Tá bom então, vamos acabar com essa pendenga. Fazemos um clubinho das meninas na parte debaixo. Feito? – Nannaninanão.... eles ficam embaixo e a gente vai pra cima! Eita! Até que foi uma tentativa.

É, vamos ter que ir ajeitando as coisas como dá e as meninas vão continuar visitando o clubinho dos meninos ainda que o ingresso seja no grito.


Querem saber de uma coisa meninos?  Aproveitem enquanto elas ainda não pegam na vassoura. Quando vocês menos esperarem vão ter que tirar o chinelo pra entrar porque está tudo limpo. Dizem que é assim que tudo começou. É o que dizem.

Aproveitem, deixem o celular e o computador de lado, brinquem muito, riam bastante e curtam cada momento. A vida é boa demais e casa na árvore é tudo de bom.

Vou lhes contar um segredo: as goiabeiras estão acabando.

Ivan Evangelista Junior, membro da Comissão de Registros Históricos de Marília

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