O
garimpo sobre a origem dos nomes de ruas e personagens sempre é muito
gratificante. Por muitas vezes, começo tendo apenas o nome da rua e uma única
referência, um fio para puxar a meada, e a partir dali buscar outros fatos e
registros que possam ajudar na composição geral. Foi assim com a produção do artigo
sobre as ruas onde ainda há pessoas que fazem consertos à moda antiga.
Num
tempo em que os caminhões tipo baú são a grande maioria da frota de transporte
rodoviário, foi interessante encontrar um consertador de lonas, lá na Rua
Prudente de Moraes, na subida, sentido da Igreja Matriz de Santo Antônio.
Passando por ali, pouca gente pode imaginar que um bom trecho da nossa história
está guardado em uma pasta de couro, entre lonas e máquinas de costura.
Sr. Antonio Lopes Neto |
Fui
lá, de forma despretensiosa, esperando registrar mais um artesão, entre tantos
que estão espalhados pela cidade. O Sr. Antônio me atendeu enquanto acompanhava
o funcionário Paulinho, fazendo marcações em uma grande lona amarela para
fixação de ilhós de amarração.
Antes
das lonas, ele trabalhou “para os padres", expressão que repete com
alegria, contando sua vinda para Marília, para ajudar na finalização da cúpula
da Matriz de Santo Antônio. É um faz de tudo, na expressão popular, é gente que
se vira; se não dá aqui, corre pra lá, e vai vivendo a vida e ganhando o pão de
cada dia.
Contou
que costurava sacaria quando os caminhões de amendoim e algodão lotavam as
imediações da indústria Matarazzo, na Av. Castro Alves. Comprava a sacaria,
fazia os reparos necessários e já passava pra frente. Com isto, mantinha suas
economias em ordem.
Depois
de um certo tempo e com o início da modernização da indústria, os caminhões
passaram a ser do modelo graneleiro. As cargas, antes expostas ao tempo durante
o transporte, precisavam ser mais protegidas, preservando os grãos e o algodão
da umidade excessiva, o que implicava na perda de qualidade e maior demora no
processo de transformação.
As
enormes lonas, chamadas de encerados, cobriam as cargas ou forravam as
carrocerias. No movimento de cobre e descobre, se enroscavam nos ganchos, nos parafusos
ou pregos. Assim, os reparos dos rasgos foi uma segunda opção para ampliar os
serviços prestados.Comprou o lote e começou ele mesmo a construção da nova sede
da empresa; fez tijolo por tijolo, ergueu as paredes e armou o madeiramento da
cobertura.
Foi
neste mesmo período da história que os padres convidaram Antônio para assumir a
coordenação da Escolinha da Associação dos Jornaleiros de Marília. A entidade
beneficente funcionava em prédio localizado na esquina das ruas Paes Leme e
Bonfim.
Atendia
cerca de 60 crianças da comunidade, promovendo a educação e a cidadania, bem
como os preparando para atuar como aprendizes nas oficinas do comércio da
cidade, muito comuns neste período. Em uma das fotos que nos mostrou, aparecem
os engraxates, todos devidamente uniformizados, com belas caixas de trabalho,
feitas por eles mesmos.
Antônio
fez questão de ressaltar que o sistema era rígido, e para continuar na
escolinha dos jornaleiros, o aluno precisava seguir as regras, ser amigo e fazer
os trabalhos conforme as instruções. "Muitos pais iam para o serviço e deixavam
seus filhos aos nossos cuidados. A minha contribuição era a formação técnica profissional,
e os padres cuidavam da educação espiritual, sempre com a efetiva participação
das famílias. A escola era uma extensão da igreja e da família", afirma
com convicção.
Neste
contexto, destaca duas personagens, muito atuantes na educação destes jovens,
pessoas a quem ele devota grande respeito e admiração. São as irmãs Marta e Nanci
Feres, da mesma família do nosso querido Feis Feres, conhecido pela histórica
atuação musical e pela "Tenda do Pai Thomaz", comércio instalado na
Rua Armando Sales de Oliveira, desde 1960.
Ao
mostrar o álbum de fotos, que ele mesmo tirou na época, vai apontando os
garotos e dando os nomes com uma facilidade que impressiona. De cada um dos
personagens, ele sabe a história de vida, menciona com orgulho expoente as
atividades profissionais que exerceram ou ainda exercem. Ficou claro em nosso
encontro que ele assumiu uma missão de vida, e cumpriu com todo o zelo e amor,
ao lado de outras pessoas que a vida juntou neste capítulo.
A
finalização da torre da igreja foi o pretexto do destino para provocar a sua
mudança da cidade de Assis para Marília. Tem muitas histórias para contar e tem
muitos amigos.
Ivan
Evangelista Jr, é membro da Comissão de Registros Históricos de Marília
publicado no Jornal Diário de Marília, edição de 22/02/2015
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